O brasileiro, na genética e na cultura, é mestiço
O brasileiro, na genética e na cultura, é mestiço. O país é ameríndio, africano, europeu e do Oriente Médio. Ademais, Europa, África Ocidental e do Norte e a terra de sírios, libaneses e judeus eram, já em 1500, os espaços mais miscigenados, no sangue e no costume, entre todos. Logo, o brasileiro é um mestiço formado pela contribuição de outros mestiços, muito mais do que pelo nativo, responsável por pouco além de 10% da carga genética do nacional do século XXI, com contribuição ainda menos determinante para a formação cultural, pois não falamos nem tupi nem kaingang, nem os lembramos pelo comportamento. Até comemos derivados de mandioca, porém consumimos mais derivados de trigo e carne de animais que não existiam nas Américas antes da era da navegação oceânica.
Uma revisão acadêmica, conduzida por Souza e outros, de 2019, apontou para o Brasil média ponderada de 68% de genética europeia; 20%, africana; 12% ameríndia. Outra estatística, publicada em 2023, baseada em 200 mil testes genéticos, do laboratório Genera, mostrou média de 75% de genes europeus; 11% africanos; 6,5% nativos das Américas; 5,4% do Oriente Médio (metade destes judeus); 2% do leste asiático. A diferença entre os resultados é explicado tanto pela grande diferença no número de amostras quanto pelo fato de que os testados pelo Genera pagaram pelo exame dos marcadores genéticos e estão mais concentrados no Sudeste.
As diferenças de localização e recortes presumidos de renda não é tão determinante contudo. Pesquisa conduzida por Azulay e outros no Maranhão, publicada pela revista Nature em 2022, com ampla maioria de amostras de baixa renda e autodeclarada parda, encontrou 46,5% de ancestralidade europeia; 28,5% africana; 25% indígena.
Esses resultados são uma média entre marcadores DNA patrilinear (Y) e matrilinear (mitocondrial), ou ainda autossômicos (nem um nem outro). Quando separamos as heranças materna e paterna, porém, temos resultados muito destoantes. Descendemos em média 80% de homens europeus; 15% de africanos; 2% da soma de japoneses, coreanos e indígenas. Já nossa linha materna é equilibrada: cerca de 1/3 europeia, 1/3 africana; outro terço ameríndia e asiática. A historiografia explica: os primeiros imigrantes europeus eram quase todos homens e levaram vantagem sobre os nativos na hora de reproduzir com as únicas mulheres disponíveis: as índias. Os africanos também eram em maioria homens e, como os tupis e jês, ficaram em desvantagem em relação aos europeus quando competiram pelas mulheres para reprodução.
Africanos não são todos iguais: berberes, iorubás e bantos são marcadamente diferentes entre si. Segundo o estudo do Genera, 35% do DNA africano presente no Brasil é da Costa da Mina (da Nigéria para oeste); 30% banto (de Camarões para o sul); 14% da África Oriental (de Moçambique para o norte). Norte-africanos e outros fecham a conta.
Europeus do mesmo modo são diferentes, embora os marcadores se confundam. Assim, o Genera aponta DNA 39% ibérico; contra 29% da Europa Ocidental (principalmente alemães); 15%, italiano; 4% europeu oriental; 4% dos Balcãs; o restante de origens variadas. É bom manter certa reserva com números exatos nesse caso, pois os haplogrupos europeus estavam bastante misturados, o que torna difícil conciliar com exatidão origens geográficas e genéticas.
Quanto aos nativos, o Genera apontou para apenas 14,5% de ancestralidade tupi no grupo. Destoa do relato histórico, pródigo em identificar tupis, mas a distorção provavelmente se deva aos europeus terem visto e interagido com eles primeiro.
O Brasil é mais europeu do que a maior parte da América Hispânica, a vizinhança. Não porque “exterminou” mais índios, mas porque os portugueses vieram proporcionalmente mais do que os espanhóis e se entregaram mais à miscigenação, houve aqui mais imigração europeia tardia e a densidade demográfica dos nativos brasílicos era menor.
A História justifica nossa cultura. A genética confirma as justificativas. Somos mestiços. Ainda bem.
(vem aí…)